Fim

O vaso ao chão quebrado
Fragmentos de multissonhos
Agora jaz sem dono
Por todos os lados afiado

Ainda na mente intacto
Enquanto de vácuo se compor
Parado, de curvas formato
Oh, não era um vaso! Amor.

Do it!




Entreato

Após duas horas de seu almoço dominical, Edgar foi trabalhar no que de melhor ele sabia fazer: cortar árvores. Eliminava-as sem nenhum remorso, e sua idade avançada e a necessidade do dinheiro o ajudavam a sentir assim, sem uma folha de sentimentalidade ambiental. Dessa vez, era uma árvore que ficava fincada próxima à porta do cemitério, e assim atrapalhava a ampliação da entrada. A direção do cemitério resolveu aumentar a largura do portão, talvez para receber os futuros hóspedes mais confortavelmente, e aquela árvore não deveria estar ali. É uma majestosa árvore, de folhas compridas e cintilantes que há tempos vem testemunhando as lamúrias dos vivos e as confissões dos mortos. Edgar chegou meia hora mais cedo do combinado acompanhado de um facão e pulsando determinação nas veias. Começou trepando a folhosa parecendo um menino astuto, sedento por aquela goiaba lá no alto, e depois se acomodou entre certos galhos e começou a amputá-la violentamente sem dar ouvidos ao que ela lhe dizia. Rapidamente o chão estava coberto de galhos, braços, pernas e dedos, desenterrados. As almas acordaram por causa do barulho profundo do facão e ficaram observando, quase vivas, aquele momento que fazia do cemitério um teatro onde aquela peça é interpretada melhor do que os funerais a que estão entediadas de assistir. Se pudéssemos vê-las ali, ficaríamos encantados com o modo de se organizarem como platéia. Enquanto isso, Edgar conversava com o zelador do cemitério dizendo que já tinha derrubado uma mangueira naquela manhã, e consequentemente o dinheiro da cerveja já estava feito. O sol já lambia as convexidades peludas dos montes quando a entrada do cemitério se sentia nua pela ausência da árvore. Edgar vai-se caminhando, sem pressa. As almas aplaudem o fim do ato, e a carência regressa às suas fisionomias; agora só lhes restam deitar sobre suas camas ósseas e sonhar com lembranças futuras de uma nova vida. Enfim, anoitece e silencia.