Eu (casco) fora

Só naquela boca eu pude encontrar quase quinze tons de rubro enquanto ela lia um fragmento de carta recém-recebida de Moscou. Seu pai estava bem, mas não era isso que dizia na carta. O remetente era um amigo monótono que estava prestes a mudar de apartamento porque sua tartaruga estava envelhecendo muito rápido por falta de silêncio e tranquilidade. Eles precisavam de um abrigo imediato antes que a tartaruga completasse 31 anos. Por falta de espaço, ela aceitou apenas a tartaruga.
Já se passaram duas semanas, e elas não tinham trocado uma só palavra. Sua relação era apenas de olhar e sentir a incompatibilidade entre suas velocidades de beber a vida. Foram-se mais duas semanas silenciosas, e ela sentiu que a intimidade estava demorando muito pra chegar. Ela resolveu pintar todo o casco da tartaruga com aquele batom rubro. Vendo aquela superfície só pude encontrar apenas 4 tons, todos foscos. A tartaruga não colocava mais a cabeça para fora desde aquela mudança. Quando ela se aproximou do casco, percebeu que estava vazio. Só havia um bilhete:
"Agradeço apenas os olhares, porque essa cor que você me pintou faz muito barulho e me tira do sério. (Agora compreendo os beijos.) Ele queria abraçar o tempo por mim, e você queria me mudar. (Eu já faço tudo isso há algum tempo.) Não me procure, (estou tentando ficar transparente)."