Ao invés de contar caso pra vc,
é melhor ser um caso seu.

leitor de mão

se essa rua fosse mão
meu dedo mendigo faria jus
a sua chamada carente de assunto
meio de tarde, aquela impaciência
o trânsito assinando o tempo
os farois apontando nossas diferenças de classe
a infância em outra cidade
a rota de nossa história em cartas divinatórias
descrever é apontar recortes.
e o polegar é que fala em touch.

A imperatriz

A Imperatriz passou por mim
Atravessei a rua em estado de regar plantas
Olhei pra trás e havia uma memória de mãe
Possivelmente
Dada a circunstância
Ela piscou o olho pra mim
Como quem diz
Mantenha os passos firmes ao atravessar fogueiras.

O altar

Ele está no quarto e nunca dorme
Vira porta, vira portal
Virou lençol
Fui dormir com uma pergunta e acordei contente
De repente se fez presente
O primeiro arcano sobre o sol.

caminho

aquela noção de chuva
quando ainda nubla.
regar já foi
coragem de nuvem.
stalkeio
mas quando tem
vai hackeio
poeirinha que anda pra frente demais vento espalha
pisa
joga na terra
afofa
não se mistura
decompõe
renasce loka da cavala
sem arreio
desde cedo galopava meio mundo de corpo
quando o tambor bate no coro e no cora do tempo,
o desaviso não desorí
ente

conflito

primavera veio
a janela do quarto de betinha
antes não molhava
agora sim
ele acorda suado
e vai trabalhar.

eu latinha

se fosse pra supôr-do-sol
levo a quarar
a bala, a moeda e a agulha
do baleiro
e o próprio baleiro
seu tactel sem nome
sua cor de isqueiro
o nome da mãe na pele
e a ruga no cotovelo.
não arremessar amanhãs.
é o que tem pra hoje.

cerimônia

as miçangas no pescoço
tem dança na cervical do cabelo
tem banho de assento e de chuveiro
ao mesmo tempo
corrente sanguínea
nylon de armarinho
e pubianos no azulejo
acústica de banheiro não guarda segredo

ao mesmo tempo
cortina de fumaça
presença de vento
frente fria
curto-circuito de pertencimento.

já dizendo

de agora o corpo tenta
exasperar os limites do dizer
já dizendo que dos pormenores
não estaremos livres de inflação
já dizendo que na maioridade
somos basicamente assunto e pão
e por vezes, alguns cacetes
que se fermenta na memória
qualquer roupa suja pode ser confissão.

bur/i/lando
a complexidade da vida
entre otimismos e otimemes.

ir-rigar

deixar de limo
que a terceira margem
do rio
não tem segundo turno.

meias

meias
palavras lidas
ao pé da letra
caminham ausências.

escaps lock

nosso estudo proxêmico
borrando cafés, limites
datilografias e fins de mundo
a torto e a direito
estamos sempre entre abismos alheios
quem sabe nossa voz se faz mais justa
em vias de dúvida
escaps lock

saca-rolha

traduzir-se:
explícito santo

sobre liquidez:
minhas lágrimas:
desconheço

amo tempo de cobra trocar de pele
- Deus é um terço da missa.

Verde

sinceramente,
tenho devoto amor
pela mordida do gato
na folha do jovem abacateiro
e na implosiva pimenteira
assim reparo
nesses prefixos da casa
voltados para cima
em existência ocupada
em crescimento invisível.
- Não falo que tô bebendo pra não rotular.

Título

essa rede de fibra
a balançar
sua única deriva
meu pé direito
suspenso numa gravidade lunar
a cabeça tem um pensamento
cor de seda verde-limão
torcendo o pensamento bagaço
nessa madruga
silêncio de pedra
todo o mistério do mundo na palma
da mão na rede de fibra
a linha da vida
a curva da rede
a balançar faminto
o corpo pelo espaço
falando em braile
só lido em tato.

Tese de deslocamento

para aporte teórico
telha observadora 
de sombra de árvore
que roça na bica
conta segredo de água
na fruta que não escuta
suculência resguardada.

Luxo

que tempos
de tem que
me erram.

Quarta

a savana da sala
em deslumbramento tardio
repara o fim de tarde
que se põe no longe
atrás do edifício luxuoso
lado-a-lado tenta a padaria.

Diagonais

um gato em negrito lê
da janela da sala itálica
a sombra do acabateiro
fazendo métrica na calçada

a cidade na constância
o hemisfério do pijama
quando você acorda antes
do alarme dizer

nossa ressaca de fim de agosto:
como demorou!
ainda que quebrar copos
e comprar perucas
nos mantém em comum estilo.

de A a Belhas

a nossa rede
no balanço das rédeas
o wi-fi sobre nossas cabeças
e sobre as nossas cabaças
o ruído da dissincronia
vira atraso o ato que não virou
experiência ainda
suspensa no tempo
a espreita de noz moscada
sacode no vento galhos e galhos
de nós mascados
indo-se os dedos
ficam-se os mascarados
aonde o/a braço
ao cança.

des off ir

ir o devir da pedra - gruta
parada em estrada verde
a sala de espera em agosto
florescem urgências pétalas
meu bem me quer fazer aprender
a regar as plantas
a lembrar de beber água em noites de porre roxo
o vinho são jorge nas intermitências do dragão
fluindo a pedra mole
a greta garbosa
trocando de pele
em plena
a avenida
a espera
um táxi
um amanhã ser.

aorta

a estante de livros
tá gelada no inverno
o ferro e a falta
encontram o silêncio
entre teias de aranha e ficções
os romances amarelam com o tempo
de manuseio
não lidos
os assuntos
na ponta dos dedos
não folheiam
nem se molham de saliva
temporariamente jogados fora
não se lixam.

jor now

procura-se se queer
na capa da nata
uma vy(a)da
que posa na caça
ex-tampando no tempo
a mancha em playback
a manchete estampida
entre fuckhnicolor
o feed semanão
foi caso jor now.

fando

fomos conversando
voltamos sem ter visto
o que era aquilo
que estávamos gritando
sem ter ouvido
algum atraso
tem tom de avanço.
o mundo tá
cego de .
de vista
de .
de vista
o mundo tá
c ego?
A FOLHA QUE PEGOU CARONA NO PÁRA-BRISA, DEU NO BAIRRO SEGUINTE.
isso de tratar o tempo
como quem trata
uma galinha
tá me deixando mal passado.
o olhar não muda
divisão
quando o corpo
armadura

rodoviário

que minha meritocracia hoje desatinou
via papel de carta de temática floral
só voltaria quando perdurasse num arbusto
robusto e primaveril entre os tantos capins
escorregadios que compõe um estrada vaga
balançante no vento do automóvel no asfalto
falso e petrolino
como henna na pele clara de um mestiço rodoviário

quando café cedo não se faz notório.

repouso

pro sono pesado haja
travesseiro de pena
que não gosto
prefiro deitar
sobre um muro e um braço
de lado
eu passo léguas
de madrugada esvoaçante
escutando o som do ventilador
pra espantar os pernilongos
e pesadelos atrasados.

esqueci de lhe dizer.

de A a V

es
ca
va
ndo eu
retro
es
ca
va
dei
ra
ora
se
min
ha
mão
no chão
resolve
ab
sol
ver
de
ponta
cabeça
um
sa
ci
me
cânico
fun
din
do
a
tu
a
cu
ca.
...

- um lugar que você gostaria de estar hoje?
- em meio ao mundo.
...

- você anda como quem corre de galochas.
- desconhecer o aí do que vem também é nadar.
na madrugada dá tempo:

de pôr as aspas no "hoje"

o óbvio no berço

o sono no cabelo

limpar o cinzeiro

mastigar o longe

fechar ciclos:
nem que eu tenha que voltar amanhã.

amornar

num caso de amor
entre o domingo
e o dadaísmo
tudo tarde:
acordar, almoço
farda de molho
lata de milho
trânsito frouxo
cinismo
daqui
até às seis
vai sobrar algum caroço?

coador

posto que é chama
que seja térmico
enquanto bule
se não for café com leite.

céusius

queimar a língua e perder os pontos a seguir na escrita ao sabor da pressa de esfriar quem sabe a palavra inflamável tem gosto de mar quando choro quando preparo paladar um segundinho a mais de silêncio pra mim e pra você e pra mim demorar na temperatura do último dito que fizemos hoje acordamos sem precisar de despertador quando a falta de sonho já é suficiente pra levantar da cama e sentir que é isso às vezes queimar a língua provoca um sopro de alívio
eu tenho dificuldade de falar certas palavras, porque tenho um talento de conotá-las em inúmeras possibilidades antes de você. eu tenho facilidade em precipitar-me. eu tenho dificuldade de derramar lágrimas, mesmo quando o pulsar da minha respiração acontece no ritmo da de um passarinho baleado. apressada, morna e apegada. eu tenho dificuldade de responder perguntas para daqui a dez anos. eu tenho facilidade de encontrar respostas com baixo prazo de validade. eu tenho uma cicatriz na testa, de quando eu tinha cinco anos, já tentando atravessar abismos. só que daquela vez eu tava acompanhado. só que daquela vez só eu saí ferido. só que daquela vez só eu levei os pontos. só que daquela vez só eu lembro com clareza até hoje. só que daquela vez eu não fazia a menor ideia que crescer fosse encontrar consigo mesmo mais adiante, e não saber responder quando se pergunta às vezes, como vai? só que daquela vez e até hoje eu continuo tendo pouca experiência no olhar. mas parece muito. e por falar em muito, passei muito tempo me desacostumando a olhar pra você. só que daquela vez me parece muito agora.
sobre as infiltrações que andam acontecendo em casa: não devo deixar de lavar a louça. entre um prato e outro, me dou o tempo de pensar nos ciclos que preciso fechar. aquilo que se suja é uma tentativa de ser honesto consigo mesmo. essa semana o cotidiano andou tão derrapante, sem dar o tempo de sentir a véspera de qualquer mudança. o presente não me espera para mexê-lo e perpassa aglutinando as notícias dos que passaram por mim ultimamente. e ultimamente tem chovido bastante, entre o limpar e o expulsar. tem chovido e hoje é para aqueles que carregam uma ilha no nome.

Monólogologia

no meio da rua tinha um domingo
esperando um caminho atravessar.

no meio da espera tinha uma rua
esperando o caminho atravessar.

no meio da rua esperei na segunda
vez - que resolvi desesperar.
o real
custa
caro

como a
orelha
escuta
a cera?
dormir tá virando um esquecimento.